Estamos descalços
ninguém nos vê
nos mapas de viagem
ninguém se lembra da gente
estamos com os olhos
marejados de fome e solidão
nos falta comida, afeto, atenção
nos roubaram tudo
a vida aos poucos se esvaindo
nos roubaram o pouco
que tinhamos:
a terra para cultivar,
as nossas casas,
nosso sonhos mais caros
e singelos
os meninos e as meninas
vagam sem ter lugar
onde brincar, onde criar suas estórias,
suas fantasias e invenções
fundamentais
onde estamos ninguém sabe
os que sabem nem divulgam
o paradeiro
o capital armado não sente nada
apenas mata, fuzila, sufoca
aniquila gente como se nada fosse
não ouve o choro sentido
desolador
nem os gritos de dor de tanta gente
por que tanta gente tem que sofrer
tanta dor por causa do egoísmo alheio?
por que tal opressão, tanta humilhação?
por que tanta gente fica indiferente
vendo isto como se nada fosse?
como se fosse melhor que qualquer
humana criatura?
a gente olha as poucas imagens
e se revolta e chora, não aceita isso
de modo algum
muito a fazer, por onde começar?
sempre há algo a fazer
sou pequena, uma luzinha tímida,
quem sabe faça diferença com outros
ao me juntar
ser uma presença, ao menos,
para acalmar um pouco essa dor
que me choca, me inquieta,
me questiona e que exige
a minha ação decidida
não posso mais me omitir
são gente da minha parentela
de longas datas, também.
Rosa Bautista Machado
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